24 outubro 2008

O sabor da vida



Fui visitar José Monteiro, lá pelas quebradas do Tibagi, numa pequena vila de mil e poucas almas, a maior parte espalhada pelas férteis planícies de terra roxa. Me recebeu com um forte abraço e um sorriso aberto. Sentamo-nos em dois banquinhos e enquanto Vilminha, a filha mais velha, preparava o café de coador, eu me deleitava com as novidades do povoado. Monteiro sempre foi um bom amigo, e estava feliz pelo meu retorno inusitado, ainda que passageiro. Quatro de seus oito filhos me receberam, acompanhando a conversa em silêncio de respeito. 

Olhavam o professor da cidade grande, tomados pela curiosidade que o semblante inocente não conseguia ocultar. Degustavam cada palavra, imaginando como eram diferentes as coisas para além dos horizontes. Vilminha, a mais velha dos irmãos que ficaram, no viço dos dezesseis anos, parecia uma mulher formada. A última vez que a vira, estava no colo de Isaura, a mãe já falecida. E o mais novo, Salviano, nome do avô paterno, já alcançava os oito anos.

Terminamos o café e fomos caminhar um pouco, para ver a horta e o pé de jabuticaba. Acompanhou-nos Cabeção, o cachorro da família, um vira-latas espevitado e brincalhão, que gostava de avançar cortando nossos passos. Senti o ar saudável, o vento revolvendo o cheiro da terra e ao longe, nuvens carregadas prenunciavam uma chuvarada das boas. Abaixei-me para tocar a terra vermelha, tomei um punhado na mão e despejei aos bocados. Monteiro apenas observou, intrigado, em seu silêncio matuto. 

Então brinquei com Cabeção, que me solicitava há tempo e olhei para meu amigo. Nada ali indicava o pânico urbano dos investimentos e da correria frenética. Não havia a mais tênue reverberação da insensatez humana global. Poderia sentar à varanda e silenciar-me em paz, sob o gesto receptivo de meus anfitriões. Tudo conjurava, inclusive o saboroso aroma da jaboticabeira, para que eu permanecesse sem tempo para o retorno.


Nenhum comentário: