06 maio 2009

Agadez



Nada, senão um punhado de construções que se intercalam com os vazios desolados, espaços por onde vagam sombras perdidas, que se abrigam preguiçosamente das jornadas ensolaradas, de brilho ofuscante. Quando chega a noite, ela estimula a serenidade bucólica e o que era silêncio diurno torna-se noturno, mais avesso à presença humana. Um ponto perdido no meio do percurso, um lugar que se insinua contra qualquer previsão e se espraia em meio a um não-lugar, esquecido da ambição humana. 

Pois Agadez resiste e faz com que nossa existência humana faça sentido. De que substância se alimenta sua alma? Para nós, mortais afeitos ao descompasso das gangorras modernas, imersos nas delícias do consumo, Agadez não passa de um nada ruminado no meio do deserto, onde sua existência não incomoda a imaginação e sua ausência jamais será lamentada. De ora em vez, um movimento soturno perpassa a paisagem, a passagem de uma caravana ou o estalar de um galho seco que mobiliza a placidez de sua realidade abandonada. O que há de mais descartável neste mundo de interesses corporativos do que os desejos que brotam no cotidiano de Agadez? 

Por que não aderirmos ainda que por uma breve jornada ao convívio tão distinto e experimentar um correr diferente do tempo? Deixar-se enlevar pelas expressões humanas, no momento do calor supremo sentir o suor escorrer pelo corpo vivo e ao primeiro anúncio da fome, apreciar um pouco do mingau preparado pelas mulheres de roupas coloridas. Ao cair da tarde, acompanhar o jogo de luz e sombras que redesenham becos de desenhos intrincados, mosaicos feitos de adobe. 

Sentir o vento que escapa do deserto anunciando a chuva imprevista, que surpreende ao longo de uma caminhada, lavando a alma empoeirada. E antes do cair da noite, ouvir a voz modulada que ressoa pelas paredes, um canto que se fortalece como uma oração ao prevalecer sobre o silêncio dos corações e acalentar mais um final de jornada. Então se dar conta do crepúsculo, como o complemento da benção, a envolver a todos por igual, convidando ao repouso sobre uma manta de algodão, estendida no chão arenoso de um casebre. 

As portas se fecham até o amanhecer, quando novos rumores ecoarão pelos espaços percorridos por cães esquecidos, anunciando mais uma jornada sem qualquer urgência. Em Agadez, a vida se renova assim como a singeleza se alimenta no coração do sábio.




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