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A mulher de olhos de um azul oceânico não estava bem na última vez em que a vi. Encontrei-a no saguão, sentada em sua cadeira de rodas, aguardando o filho que tardava a chegar. Seus olhos já não eram convidativos, embora sua expressão continuasse de uma bondade infinita. Tinha pressa, ia para minhas aulas diurnas, mas havia algo com aquela mulher que combinava com a luminosidade daquela manhã, intensa, sublime, que me fez permanecer. Seu sorriso se antecipou às palavras corriqueiras, como está, o que tem feito, pronunciadas com certo incômodo. Segurei-lhe as mãos suaves, envelhecidas, e tive o impulso de marcar a entrevista que há tempos desejava fazer, para falarmos sobre...
Ela de fato não estava bem. As pessoas caminhavam a passos apertados do lado de fora, em função do trabalho, das tarefas intermináveis do cotidiano. Homens e mulheres em transe, bem vestidos, solitários, necessitados de suas mesas. O encanto da manhã se lhes escapava, com as feições graves voltadas para o chão. Desejava me submeter àquela luz radiante que realçava o colorido das coisas e que inundava o mundo. Maria, de sua parte, seguiria aguardando pacientemente o filho que não chegaria. Suas mãos inocentes, sem forças, convidavam a reviver os momentos decisivos por elas emoldurados. Pensei nas cartas de amor, manipuladas com ternura. Suas mãos, agora apostas no colo, descarnadas, desejando apenas repousar. Em comunhão com elas, alinhava-se o corpo frágil, esse insólito filete de alento que sustentava a serenidade de uma vida feliz. Maria vivenciava seu momento de plenitude e ocaso, sem dor ou tristeza, então permaneci um pouco mais ao seu lado.
A manhã magnífica se estendeu indefinidamente, embalando reminiscências e presságios.
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