16 agosto 2009

O pior e o melhor dos mundos




Não deixei de beijar, nem de dar as mãos para meus amigos, para as pessoas que me cercam. O mesmo aconteceu com eles, não deixaram de viver a realidade da vida cotidiana. Não deixamos, por necessidade ou por prazer, de tomar condução pública, de ir ao cinema, de caminhar nas calçadas, de entrar na fila do café, de esperar uma pessoa querida numa livraria, de ir às aulas, de namorar, de conversar, de reagirmos naturalmente como seres humanos que somos. O desejo e a necessidade do encontro sobreviveram a mais um terrorismo midiático, que como tem sido comum para os interesses de uma oligarquia midiática, buscou instalar um clima de temor generalizado.

Temor generalizado que não construiu outra coisa que insegurança social, e para os interessados, em índices de audiência. As chamadas noticiosas não se preocuparam com a informação – séria, sem controvérsias ou espetaculosidade – mas com as suspeitas, com as dúvidas, com a fatalidade de mais um pânico devidamente mantido a fogo brando. A contagem mórbida, mais um suspeito de gripe ali, mais um morto aqui, não, mais dois, agora mais seis... não, não, mais oito... bem, essa contagem mórbida só era suspensa para as reportagens sobre hospitais lotados, desespero popular, a falta de medicamentos e produtos de assepsia. As declarações de médicos, de autoridades de saúde, eram exploradas em seus pontos não-coincidentes, criando naturalmente um discurso evasivo, quando não artificialmente contraditório.

Esse jornalismo, que convém ser descrito como terrorismo midiático, assustou, em vez de comover; desagregou, em vez de organizar uma forma de combate à gripe, conduzindo (ou desejando conduzir) a população à incerteza, ao lugar comum de uma tragédia instalada e impossível de ser assimilada. E, a exemplo do “pânico dengue”, do “pânico gripe aviária”, do “pânico crise”, o “pânico gripe suína” é superada pela continuidade natural da vida cotidiana, cujos atores sociais sabiamente depuram a farsa dos inúmeros e verdadeiros dramas existenciais. Esse terrorismo midiático nos isola, nos aquebranta, rompe com toda e qualquer atitude solidária e tenta nos transformar em sombras de nossos temores. Quando chegamos nesse estágio, já tomados como reféns, passamos a reproduzir o pânico que nos é vendido. Esquecemos o orgulho, esquecemos a dignidade, esquecemos a prática política, para reverberar o que passamos a entender como nosso fracasso.

Só vejo uma forma de confrontar essa mediocridade, que no lugar de nos informar, nos enferma: tomando a iniciativa da responsabilidade como compromisso de ação social. Realçar a atuação política no cotidiano, dar-lhe força, consistência, assumir o outro como parte do meu problema. Como disse um dia Germán Abdala, “a política é a ferramenta para modificar a sociedade em que vivemos”, e decerto ele se reporta aqui à política do dia-a-dia, das decisões mais prementes para organizarmos a vida, a sua, a minha, a vida em comum.




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