Un callejón sin salida - Mazatlán, 1997 |
Acompanhamos, nestes dias e semanas, o doloroso calvário de um querido amigo, ainda jovem, que integra com brilho nosso grupo de pesquisa. Quando se infectou com o vírus, foi dispensado após alguns dias pelo médico que o atendeu, os pulmões debilitados. Pensamos muito nessa decisão que entregava o paciente à recuperação por sua conta, longe de um atendimento médico mais cuidadoso. Poucos dias depois, muito fragilizado, buscou nova internação em outro hospital.
A doença foi cruel com ele, imobilizando-o em uma cama, com ajuda de respiração mecânica, por mais de um mês. Foram poucos os momentos de esperança, que emergiam quando o quadro apontava alguma melhora. A dor que se instala e permanecerá está contaminada pela revolta contra uma parcela dos profissionais de saúde da medicina privada e de operadoras de seguro de saúde (espero que pouco significativa), que, ao contrário dos profissionais de saúde do SUS, profundamente empenhados e sob condições precárias de trabalho, assumiu ao longo da pandemia um papel lamentável, de pouca dignidade profissional na atenção ao paciente e ao considerar, equivocadamente, o tratamento preventivo amparado por medicações como a cloroquina ou ivermectina, tal como esse desgoverno sempre estimulou.
Desde os primeiros meses, organismos nacionais e internacionais sérios (como, por exemplo, a Organização Mundial de Saúde), desacreditaram esse tratamento. Nosso amigo deixou o hospital, na primeira vez, com os pulmões funcionando 50%, ou seja, sem uma ventilação suficiente. Teve de retornar e não mais saiu. De outros hospitais soube-se, por testemunhos na CPI da Covid-19, que após algum tempo se optava por tratamento paliativo, vale dizer, fora da UTI, com aplicação de morfina, no aguardo da morte dos pacientes. Atitudes no mínimo suspeitas, que estão a ser investigadas pela justiça.
O mais grave foi o capitão-presidente, junto ao amontoado de inconsequentes que ocupam funções administrativas, postergar por meses a compra das vacinas. Atuaram, ao que tudo indica, em uma falsa hipótese de imunidade coletiva. Com base no diagnóstico sério de médicos e cientistas comprometidos com os valores humanos, se as vacinas chegassem a tempo salvariam milhares de pessoas do sofrimento físico, das sequelas da doença e da morte. Milhares. Se não foi um genocídio cientificamente calculado, foi uma atitude que culmina, segundo a última versão do inquérito, produzido pelo relator da CPI Renan Calheiros, em nove crimes distintos, dentre eles, crime de epidemia com resultado de morte e crime contra a humanidade.
Passamos, no Brasil, por um momento tenebroso e muito triste. Não tem bastado sofrer com as políticas de aniquilamento das redes de proteção social, dos direitos trabalhistas, da educação pública; muitas famílias também sofrem com a hipocrisia e a canalhice especulativa, que em sua irresponsabilidade cognitiva condena uma nação ao opróbrio. Esse estado de coisas leva aos defensores da democracia e do estado de direito a incorporar uma resistência decidida e a determinação renitente de riscar do mapa, nas eleições do ano que vem, os integrantes de um desgoverno inepto, que de maneira deliberada afligiu centenas, milhares de famílias brasileiras, por mais que muitas delas insistam em não tomar consciência disso.
(atualizado em 13.11.2021)
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