praça Djema el Fna
Chegamos
pelo final da tarde, o sol se punha e seu tom alaranjado se confundia com a
coloração argilosa das muralhas, a uns duzentos metros da estação rodoviária.
Mal iniciamos a caminhada no sentido dos portões da medina, um jovem nos abordou
oferecendo-se para nos conduzir a um alojamento. Pedi em francês que fosse
barato e no centro, ele entendeu e pediu para segui-lo, serpenteando pelos
suqs, passando por toda sorte de pequenas tendas e lojas, onde se comerciava de
tudo. Os espaços se alargavam e se estreitavam, cruzávamos homens e mulheres em djelabas, crianças, desocupados nos cafés ou conversando nos espaços
públicos, o jovem não se detinha, caminhava célere e nós atrás, com as pesadas
mochilas nas costas.
Por
fim desembocamos em uma ampla praça esvaziada, atravessando-a no mesmo ritmo até um hotel discreto e de aparência simpática. que ao fim e ao cabo atendia as expectativas para uma ou duas noites. Pagamos nosso condutor, preenchemos os formulários para a estadia e subimos ao quartinho do segundo andar, em cujo pequeno terraço tive tempo de desfrutar a beleza do por do sol. Antecipamo-nos em uma ou duas horas a chegada dos demais companheiros de viagem, com os quais compartilhamos uma bela mesa no jantar. Ao que me recordo, no dia seguinte uma parte iria até Ouarzazate, na entrada do deserto, outra parte ficaria em Marrakech, não havia pressa para deixar a bela cidade marroquina.
É dessa época meu contato com o maravilhoso relato de Canetti, Vozes de Marrakech, embora confesse ser muito provável não ter lido todas as narrativas. Tratava-se de uma tradução precária, que não ajudou a leitura. Levei quase vinte anos para ter em mãos a preciosa versão da Cosac e Naify, quando por fim pude realizar com muito gosto toda a leitura. E percebi que meus parcos dois dias na cidade não foram suficientes para me deleitar com pelo menos uma parte das surpresas que Canetti vivenciou trinta anos antes de mim. Por isso desejo muito retornar. Trata-se de uma cidade dos sonhos, com toda sua pobreza e exuberância. O encanto está nas pessoas, nos sinais de mistério da cultura, na profusão de seu mercado, nas cores que se revelam ao pôr do sol.
A partir da esquerda, Marcelo, eu e Flávio, com crianças, 1989
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