21 agosto 2011

Um canto solene


Fazer qualquer coisa é melhor do que o tédio das imagens e a miserabilidade das narrativas esportivas no domingo. Brincar com os filhos, visitar a feirinha de artesanato, ouvir música, escrever uma poesia, tomar um café com amigos, descansar na rede, sonhando com o amor que alumbra a vida. Qualquer coisa vale, tentar ler a página de um livro, navegar na internet, dar um mergulho no mar, passear com o cachorro... menos assistir a descrição das partidas de futebol, as entrevistas, o show de entretenimento fútil e repetitivo, sob o risco de dissolver a autonomia que temos para a compreensão do mundo, e a certeza de alimentarmos a ganância de uns poucos barões da comunicação. 

Nada ganhamos com nosso sagrado tempo morto diante dessa programação televisiva, nem com a vitória de nosso time, tampouco com as videocassetadas. Nada que inspire ou devolva o alento, apenas o choque voraz, que embaralha as certezas e agrava os temores. Um ritual lânguido, que reforça o torpor e conduz ao vazio da alma, o afundamento no nada e a desolação, antes da segunda-feira de batente. 

Enquanto me proponho em levantar ainda uma vez esta discussão, aqui neste blogue, um pouco desacorçoado, mas sem perder a esperança de que saberemos romper aos bocados a pressão desse garrote infame, ouço ali, vindo do prédio em reformas, uma voz solitária que se destaca, um canto solene, ritmado, inebriante, na tarde fria e apagada da metrópole. Um homem que tece as loas enquanto reafirma sua cultura, em meio aos ruídos destoantes, essa sofreguidão sonora que estronda a selvageria dos gestos, almejando o progresso. 

Esse mesmo progresso descrito por Benjamin, a tormenta que nos impulsiona de costas para o futuro, enquanto observamos em nosso rastro o monte de ruínas a alcançar os céus...



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