30 outubro 2019

As derrotas do malfadado neoliberalismo

foto: Susana Hidalgo

Estalou o que parecia impossível, uma imensa revolta popular no Chile, basicamente em decorrência das condições indignas de vida sob o sistema neoliberal implantado desde a derrubada de Allende. Ainda hoje se observam manifestações nas ruas, com barreiras, cacerolaços, monturos de chamas, fumaça e corpos de carabineros buscando reprimir com jatos d'água e bombas de gás lacrimogêneo. Os manifestantes - e o que se percebe pelos vídeos são na maioria jovens - circulam pelas avenidas sem se deixar encurralar;.se fazem presentes aqui e ali e evitam os choques frontais. As ruas estão com aquela aparência desolada, o comércio fechado, um tapete de pedras nas vias públicas e marcas de destruição por toda parte, referências típicas da agitação insurrecional. 

Fica evidente que o grau de repressão, embora forte, não se compara com os tempos brutais e assassinos de Pinochet, tempos em que havia uma cobertura completa do Departamento de Estado e da CIA para os piores atos de violência. Piñera e seu governo encontram-se numa sutil armadilha, que os aprisiona a cada movimento mais brusco. As ofertas de negociação bem como a demissão de todo o ministério parecem não ter arrefecido a indignação popular, consequência direta de um torniquete que não parou de apertar desde os tempos do governo militar. Assim, um doloroso impasse prossegue e se manifesta vivo nas ruas, sem que se tenha qualquer expectativa de um final que aponte para uma resolução superficial dos problemas. É sem dúvida um momento crucial para a governança neoliberal, um xeque ameaçador como nunca se viu antes.

A questão: como é possível retomar a normalidade da vida cotidiana? Quais lideranças dos movimentos callejeros serão aceitas como representantes da insurreição? Quais pautas serão discutidas? Não está claro que o movimento esteja próximo do esgotamento, há uma força orgânica que surpreende, por certo com forte participação de amplos segmentos da sociedade. Pelas imagens, é possível depreender que Piñera e seu governo terão de ceder muito para alcançar uma governabilidade sustentável. Dentro do processo democrático estabelecido desde 1990, Piñera está de mãos amarradas, não poderá agir com a truculência que vitimou mais de 3.000 mortes e desaparecimentos. Já são reconhecidas 20 na contagem oficial (mais de 40 na contagem dos manifestantes) e a tensão tende a aumentar com o passar dos dias.

Comento mais tarde a vitória peronista na Argentina.


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