14 novembro 2018

Questões românticas e sobrevivência



Penso que aos poucos, e de modo duro e irreversível, nos distanciamos das “questões românticas” de nosso tempo, seja em nossas possibilidades ideológicas, em nossas ocupações funcionais, em nossas maneiras de ser no mundo. No primeiro caso, considero o exercício da prática e da reflexão política. Considerando as pessoas da minha geração, torna-se absurdamente anacrônico pensar nas lideranças que se forjaram no período de independência da África, como Lumumba, Senghor, Ben Bella, que alimentavam o imaginário terceiro-mundista dos jovens em torno de um mundo mais justo e solidário. 

O mais abstruso desse caso é observar o esforço sistêmico em tornar anacrônico e falido pensadores muito atuais como Edward Said, Milton Santos, Tariq Ali e políticos que mal deixaram o poder, sobretudo em nossa América do Sul, como Lula, Kirchner, Correa. A poderosa onda neoliberal de linhagem financeiro-empresarial lança seus dados e joga no cenário com representantes “íntegros”, com a proposta de “governança gestora”, sem qualquer tolerância à diversidade política, pois privilegia-se a liderança bancária, em sintonia com os humores do chamado mercado. 

No segundo caso, o espectro de atuação profissional se restringe fortemente, estimulando-se aquelas que igualmente estejam alinhadas aos interesses do mercado, pela pesquisa, gestão e produção. Cada vez mais eliminam-se as ocupações que valorizam o corpo e a mente, os fundamentos do bem-estar individual e social como a sociologia, a antropologia, a psicologia, a filosofia, dentre outras. Entramos em um período na qual acirra-se a concorrência, premiando-se aqueles que oferecem subsídios a esse modo de enfrentamento funcional, de professores que aplicam seu conhecimento valorizando as condições de mercado, a trabalhadores que se empenham em reproduzir práticas de gestão, tudo definido pelas cartilhas neoliberais.

E por fim o terceiro caso, talvez o mais dramático, são derrubadas a liberdade de escolha, redimensionando nossa condição de estar no mundo. A violência não apenas física, mas principalmente comunicativa, de grupos alinhados ao mais agressivo neoliberalismo econômico, demonstra que uma nova moral e uma nova comunicação se impõe, constituindo-se como voz e pensamento dessa hegemonia financeiro-empresarial que avança. 

Significa dizer, a diversidade cultural, social, política, são colocadas em xeque por uma massa de reprodutores de conteúdos vagos, inconsequentes e imprecisos, como signos de mudanças necessárias. Sacrifica-se a autonomia do indivíduo em nome de um “massivo engajamento bancário” que oferece nada além de uma mínima perspectiva de sobrevivência.      


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