20 abril 2013

Berzep, o trapezista




Berzep pensativo, a devorar cada circunstância de seus movimentos acabrunhados. Encontra a cidade grande assim, coberta por uma indiferença branca, gélida, o espaço público e seus transeuntes, homogêneos, expressões sem cariz, o opaco de uma passagem que se dispersa célere, os rastros na neve não são marcas, mas silêncio lúgubre e profundo. A luz mortiça do entardecer, vaga, os ramos secos e inertes... Pretendo falar, mas se rompe e chora, o que morre ao nascer dentro da alma... Como dizer o mal que me devora, o mal que me devora e não se acalma... poemas de Storni, cantados nas noites de verão, a vida do circo... lembra-se dos rostos iluminados, quase todos, os anões gêmeos, Lena, a domadora de leões, Rino, o homem-bala, Serena, a mulher barbada, Jeremias, o malabarista, alinhados do lado de fora do picadeiro, aguardando o desfecho do espetáculo. Sonhava com o pensamento de que talvez fosse o único palhaço trapezista do mundo! Saltava do trapézio acompanhado pelo foco de luz e finalizava a noite sob os aplausos, junto com Lídia Rosa. 

Saíam saltitantes e retornavam com os demais, para as despedidas... Tempos de circo, e agora o vento espiralado, a sondar o fronte impassível, mergulhado em dúvidas, o bloco de edifícios, a mãe conduzindo seu bebê... paisagem fria, sem compaixão... As primeiras noites, recém-chegado ao circo, era o incumbido de servir a refeição aos bichos, e em especial a Birko, o elefante, com quem gostava de confidenciar seus sonhos antes de adormecer... Observa os trilhos, caminhos para destinos longínquos, desconhecidos, enquanto reflete, com a cidade grande prestes a lhe propor uma vida puramente objetiva... Oh suave amargura, essa carícia sem fim de um tempo generoso, feito de poucas palavras, regido por olhares intensos, solidários... por amor e surpresas... Lídia Rosa: hoje é terça e faz frio. Em tua casa de pedra gris, tu dormes teu sono em um recanto da cidade. Ainda guardas teu peito enamorado, já que de amor morreste?... 

Uma vez mais retoma o presente com a alma sem um único desejo, das pessoas saturadas com seus passos tíbios e definidos... e mais uma vez os dias de trapézio, os pássaros das noites sem brisa, os violões plangentes, os anões gêmeos, Birko... Lídia Rosa.



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