30 junho 2012

Sobre convívios humanos



O ser humano, condenado a uma sequência de despedidas em sua vida. Algumas, realizadas de modo consciente, outras, de maneira corriqueira, trivial. O fato é que não deixamos de sair de cena, como diria Goffman, em busca de contatos mediados com outros participantes, novas fachadas. As primeiras, ficarão em grande medida marcadas indelevelmente; as outras, simplesmente passarão despercebidas, passando a integrar, quando muito, a memória do outro. E há, também, aquelas despedidas que realizamos sem entendê-las como tal - porque não nos parece uma despedida, ou porque não identificamos o seu ritual - e apenas nos daremos conta de seus vestígios, não de sua essência, muitos anos depois, ao repassarmos suas prováveis circunstâncias. 

Existe uma lembrança que retomo com facilidade, e que se desdobrou em duas, separadas por vinte anos: a despedida de meu amigo Ermanno Carra. A primeira vez, na cozinha da casa de meus pais, imagens incertas, ações descontínuas, aos dez anos. Algumas passagens marcantes, nos abraçamos, a entrega de um cartão com palavras de amizade, e no dia seguinte ele zarpou para a Itália. 

Vinte anos mais tarde, ao passar por sua pequena Savona, resolvi procurá-lo, dispondo apenas de seu nome na lista telefônica, e o encontrei. A ele e a sua família. Terminei por ficar e conhecer o espaço geográfico de sua vida, sua gente, sua cultura, e por alguns dias, me senti novamente como seu amigo-irmão. Na manhã da nova despedida, estava na plataforma, acompanhado por sua noiva, Monica, o trem prestes a partir, quando por fim revelou-se, do outro lado da plataforma, o corpanzil esbaforido, avançando sob a neve, e pudemos trocar um caloroso abraço. 

Acomodei-me na cabine, observava-os sob o frio de uma tarde cinzenta, os sorrisos gentis, os braços acentuando o adeus. Por alguma razão, tive o pressentimento de que se tratava da despedida definitiva, e assim foi. Descobrimos com a vida, como Giovanni Drogo, personagem de O Deserto dos Tártaros, que não há um regresso para as coisas que foram, do jeito que foram. As marcas pungentes de nossas experiências humanas convertem-se em mosaicos pessoais, revisitados de maneiras distintas, inspiradores para o prosseguimento da nossa caminhada.  



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