05 fevereiro 2011

Sobre a companhia

Cafeteria do museu de comunicação, Berlim



Fui à Confeitaria, para uma média com espuma. Para interromper um pouco as leituras. A noite urbana, com suas personagens características, desgarradas, ocupadas, adormecidas, poucos carros, um ar límpido, o desejo de colocar as mãos nos bolsos e caminhar indefinidamente...

Escolhi uma mesinha, em meio ao balbucio das personagens da noite, em sua maioria trabalhadores, que estão a pegar ou a largar o serviço. As conversas são mais sussurradas que durante o dia, se movem em outro ritmo, como se as apreensões cotidianas os deixassem por uns minutos, ou o contrário, eles esquecessem por uns minutos as apreensões cotidianas. Não importa, o ritual se conecta de modo harmônico, comem, bebem, sorriem, reclamam, acompanham as imagens das tevês... e naturalmente, o ambiente interno se esparrama para a rua, através da conversa. 


Clientes que conversam na saída com as caixas, com os porteiros, com seguranças, em breve confraternização... Arrastam-se para fora do recinto, transformam-se em cidadãos, sejam trabalhadores, turistas, desempregados, e na caminhada pelos logradouros, cruzam com prostitutas, que conversam com garis, que conversam com os guardadores de carros, que conversam com os mendigos, que continuam abandonados... Fluxo de relações que não se rompe, alimentadas pela informalidade do momento... A cidade não é assim, ganhará outra roupagem pela manhã, mas isso é outra conversa...

Esqueço o dinheiro, o chefe me conhece, pede para que eu não me preocupe, saio para a rua, uns poucos passos, ouço de passagem a conversa de três catadores de entulho diante de uma caçamba, em meio a falas mornas, divertidas, um defendendo a tradição do Corinthians, dois ironizando o argumento... mais adiante, já na esquina com a Augusta, um homem irrompe em minha frente, Um minuto, doutor, só um minuto... Sem que me detenha, ele me estende uma nota de 5 euros, a voz empostada, Só quero saber quanto vale isso?... Digo-lhe o valor aproximado e ele logo se junta ao amigo, comentando sem entusiasmo a informação obtida... Acompanho-os por um tempo, antes de desaparecerem na noite. Embrenham-se pelos desvãos infindáveis de um espaço que os ignora, essa invisibilidade empírica que nos interroga sem cessar, sempre a transcender as respostas praticadas nas reflexões acadêmicas...

Em casa, prossigo por mais um pouco na leitura, antes de ceder ao cansaço. Vem o sono, com ele os sonhos e em um deles, outro encontro: estamos em um colégio e fazemos uma prova com os alunos. Você está com as mãos carregadas de pastas e papéis, me lembra aquela menina com saia do Colégio. Ao final, nos encontramos em uma mesa da cantina. Então, você me diz que dará seu passeio pela orla, e pergunta se desejo acompanhá-la...

Enquanto deixamos a escola, ajudo-a com as pastas, e seguimos a caminho do mar, e penso, em busca da livraria de sua juventude, e de um sorvete de casquinha...




2 comentários:

Unknown disse...

Olá professor, tudo bem?
Eu sou a Larissa (estudante de RP da FAAP), tive aula com você no semestre passado.
Fiquei muito triste em saber que você não vai mais lecionar na FAAP. Mas também fiquei feliz em saber que você e a professora Mônica vão lançar um livro! E quando for o lançamento desse livro, todos nós de RP vamos lá prestigiar vocês!

Muitas saudades de você professor!
Beijos
Larissa

Marco Antônio Bin disse...

Obrigado pelo carinho, Larissa.
Quando chegar o lançamento, certamente vocês serão convidados!
Um abraço.