Gosto de Simmel porque sua análise é premonitória: fala da economia monetária, do turbilhão da metrópole, das demandas crescentes, da prevalência do tempo do relógio, da fragilidade humana exposta pelo comportamento blasé, e sua conclusão sutil, a perda da vida subjetiva em nome da vida objetiva. Tudo muito didático, exposto como disse, há mais de cem anos (1903). Não é à toa que Bauman se utilizará de seus conceitos para erigir sua visão líquido-moderna, baseada nos temores pelas diferenças sociais insuperáveis (a segregação urbana desenhada em nome da segurança - ou da ausência dela).
Na última semana, dediquei-me a ampliar esse mal-estar social, discutindo um outro autor, Richard Sennett, menos influente que os dois anteriores, mas com interessante perspicácia em suas análises do comportamento. Em A corrosão do caráter, ele faz uma abordagem do nosso tempo, tomando como ponto de partida as nossas carências, geradas e aprofundadas pelo capitalismo de curto prazo. Dirá que a velocidade das mudanças eliminará o longo prazo na planificação das corporações, estimulando a força dos laços fracos, nada mais do que as formas passageiras de associação e, acrescento, frágeis e indiferentes (a terceirização dos serviços seria um bom exemplo, essa impessoalidade simmeliana que privilegia a produção), afetando diretamente a vida do indivíduo.
Pois nas palavras de Sennett, o capitalismo de curto prazo corrói o caráter... as qualidades que ligam os seres humanos uns aos outros... Não há como ser diferente nessa selva metropolitana, regida pelo relógio e pelas demandas crescentes. A vida objetiva desse ritmo sufocante nos aponta para sucessivas contradições, como a sustentabilidade em oposição à ganância; o sonho do lazer em oposição ao esgarçamento do horário de trabalho; a ética em oposição ao sucesso a qualquer preço...
Mas a contradição mais contundente seria o contraponto entre os modos de ser que regem nossas vidas. Para Sennett, o comportamento que indica o sucesso no trabalho está em completa contradição com o modelo da vida familiar. Ou, em outras palavras, não é possível produzir uma educação consistente, utilizando-se das normas apregoadas pelo mercado; um filho demandará todas os cuidados (a longo prazo) que não estão contemplados na dinâmica acelerada de resultados do capitalismo.
A resultante disso: os valores da vida familiar (eu estenderia para a comunal) organizam-se em regras fixas, enquanto o mercado gira em torno de decisões alimentadas nas incertezas das circunstâncias. Dessa maneira, o comportamento ético está definitivamente excluído, acarretando a corrosão do caráter e, como consequência, a deriva do indivíduo, adernado, fragmentado, sem qualquer compaixão.
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E é certo que iríamos para além da corrosão do caráter, ao falarmos sobre a banalidade discursiva do oligopólio midiático deste país, que perdeu completamente a credibilidade para informar. Estou convencido (em grande parte, graças ao exemplar trabalho de informação das redes sociais) de que estas eleições sepultarão a maneira arrogante e oportunista desse jornalismo descomprometido com a verdade.
Nada mais vil e degradante, tudo em nome da candidatura Serra, que só faz naufragar, vertiginosamente. Candidatura que, já há um bom tempo, não se preocupa em expressar as propostas de sua plataforma política para a sociedade civil.
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