19 setembro 2022

Gonzalo Millán, um poema


Gonzalo Millán (1947-2006)



Poema 48

 

O rio inverte o curso de sua corrente

A água das cascatas sobre

As pessoas começam a caminhar retrocedendo

Os cavalos caminham para trás

Os militares desfazem o desfilado

As balas saem das carnes

As balas entram nos canhões

Os oficiais guardam suas pistolas

A corrente penetra pelas tomadas

Os torturados deixam de agitar-se

Os torturados fecham suas bocas

Os campos de concentração se esvaziam

Aparecem os desaparecidos

Os mortos saem de suas tumbas

Os aviões voam para trás

Os rockets sobem até os aviões

Allende dispara

As chamas se apagam

Tira-se o capacete

La Moneda se reconstitui íntegra

Seu crâneo se recompõe

Sai a um balcão

Allende retrocede até Tomás Moro

Os detidos saem de costas dos estádios

11 de Setembro

Regressam aviões com refugiados

Chile é um país democrático

As forças Armadas respeitam a constituição

Os militares regressam a seus quartéis

Renasce Neruda

Retorna em uma ambulância à Isla Negra

Dói sua próstata. Escreve.

Victor Jara toca o violão

Canta

Os discursos entram nas bocas

O tirano abraça a Prats

Desaparece

Prats revive

Os desempregados são recontratados

Os operários desfilam cantando

Venceremos!

 

 

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