John Coltrane
O que faz com que optemos por caminhar no sentido do precipício?
Redução, eliminação, perdas de direitos trabalhistas, previdenciários,
oferecemos com uma mão e não recebemos nada em troca, a não ser uma vaga
promessa de mais emprego, mais crescimento econômico. O neoliberalismo se
esmera em isolar o indivíduo em sua luga inglória por um pódio, por um brilho
efusivo ainda que obtido na marra, onde mérito se confunde com arranjos éticos
obscenos.
A previsão é
que até novembro deste ano sejam conspurcados nossos direitos e dessa maneira
nossa forma de compreender o trabalho e o tempo que o sucede. Como se definirá?
Restará nesse mundo apenas o direito a se esfalfar durante décadas por um
mirrado salário, até o fenecimento do corpo? Haverá alguma chance de preservar
o equilíbrio entre corpo e espírito, ou só haverá chance para o despautério
moral, a luta infindável pela sobrevivência?
Os discursos midiáticos já se
encaminham para o reconhecimento bancário, ça veut dire, o esforço
diário em nome do anonimato e da gratidão. As pessoas se corrompem ao tolerar seu quinhão patético e já estranham quando deparam com aqueles que incorporam a luta por um ideal igualitário. Assumem o que lhes resta, o consumo e a projeção egoica e terminamos com os sonhos mal definidos de uma caminhada digna, nas alamedas convidativas do Estado de direito democrático.
De outra parte, já segregado desse mundo de trabalhos forçados,
sigo organizando meus textos e realizando as leituras indispensáveis.
Moniquinha viaja por Portugal com seus familiares, ainda ficará mais dez dias
vivenciando este lindo momento. De quando em quando nos comunicamos, é visível
sua satisfação, o momento de pura leveza. Aguardo-a ansiosamente.
Enquanto isso
retomo o caminho das letras. A imagem de Coltrane com seus saxofones é a imagem simbólica da próxima obra. Ontem estive na pequena editora que me publicou, para uma saudável
conversa com o editor e outros autores. Expressei meu desejo em ler os
escritores da casa, que já somam centenas. Está aí um trabalho que merece todo o
reconhecimento, a publicação sem um tostão de custo, sem interesses gananciosos, sem grandes demoras, onde o objetivo é divulgar e disseminar literatura. Dessa maneira, muitos bons escritores condenados ao silêncio têm a oportunidade de apresentar seu trabalho.
De minha parte, retomo a singela proposta lá do início, ler e escrever. Retomo esse universo das
letras, mais ameno, sem cobranças infundadas, que se deixa levar ao sabor das
estrelas.
(atualização em 25.09.2020)
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