28 setembro 2014

Um mundo de diferenças


A noite se faz mais escura que de costume, pois a vejo diante de mim, absoluta, quebrada por um punhado de luzinhas tremeluzentes ao longe. O silêncio da cidade desconhecida não me assusta, não estou cansado ou mesmo deslocado. Não me sinto no meu lugar, e não me esforço em torná-lo, após a superação do estranhamento, simpático. Na verdade, não sei o que faço aqui. Nas inúmeras viagens que realizei por tantas partes, o momento mais ingrato sempre foi a chegada, e o mais triste, a partida, e assim foi em todos os lugares, pequenos, grandes, confusos, atraentes, feios, bonitos. Era difícil superar o inesperado na chegada e a amargura da partida. Desta feita, o estranhamento não se desfaz e prolonga-se já como amargura. Sentimentos muito sutis, que vão e veem, sem se incomodar comigo. Permaneço em compasso de espera, os textos e livros se espalham pelo quarto, deveria estar mergulhado em estudo, por certo preservo alguma sensatez, farei alguma leitura daqui a pouco, e desvanecerei em sono. Me aguardam amanhã para oferecer uma chance, nada dirão de agradável, o que de fato não é um problema, nada prometerão e em três ou quatro dias jamais saberão que encontraram a mim e a todos os que estiverem ali, em busca da mesma chance. Amenizo a espera incerta ouvindo um misto de Rolling Stones, Chico, B.B.King, em um quarto iluminado por uma claridade vaga que provém da marquise do oitavo andar. Distante de minha querida, vou me esforçar para realizar esforços minimamente competentes. Vou já descer para recolher as cópias dos documentos que submeterei aos homens sem rosto e tão desnecessários. Mas não vim até aqui para pensar coisas chatas, nem tampouco para elucubrar. Afasto-me por uma semana de meus alunos, mas até isso me soa artificial agora. Há uma brisa que ensaia delicadeza, esgueirando pelo quarto, deixando-me com meus pensamentos. Retomar as leituras que me fazem um pouco mais vivo e completo, por aí espalhados estão Cesar Sandino, Prebisch, Cárdenas, Carpentier, eles me dão um bom motivo para estar aqui. E minha querida amada, que me entusiasma nos projetos, que me faz falta. Por nossas conversas, pela musicalidade, pelas boas e divertidas verdades... Foi muito fácil chegar até aqui, mas será muito complicado sair, haverá um tempo de espera que parecerá eterno, sem ser ameaçador ou ingrato, como um passeio em torno de uma ratoeira de mentira, que anuncia despreocupada o fim de qualquer ilusão, o que também pode ser uma mentira. É isso, estar aqui não me confirma a realidade nem a ficção, não é possível fazer mais do que esperar, para saber se o que vai acontecer será bom ou meramente desnecessário...


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