16 julho 2014

Ivan Junqueira


Ivan Junqueira faria 80 anos em novembro e de sua obra muito pouco ouvi falar e nada conhecia. Apenas com sua morte procurei conhecer um pouco mais do seu percurso como crítico literário e poeta. Sua fala, que pude acompanhar, reproduzida em sua homenagem, fluía serena e atenta, como os versos de suas poesias. Impressionou-me a oposições em perfeita harmonia, a severidade para com o cenário da poesia nacional em contraposição com a delicadeza de seus argumentos, bordada não só de cuidado no expressar escorreito, mas também filtrada por um fino olhar poético. 

E como não poderia deixar de ser, alcançou-me o valor e a consistência da sua obra poética. Por ele, nos chegaram as traduções criteriosas de Baudelaire e Eliot. Nunca, como disse, havia me aproximado de sua poesia e agora, ainda que um pouco tardiamente, começo a apreciar o frescor de sua arquitetura sutil e elegante. Estive uma vez, há seis ou sete anos, na Academia Brasileira de Letras, no Rio, com a preocupação de visitar um imortal menor, em função de um prêmio literário não recebido. Pura perda de tempo. Poderia ter me dedicado a outro, de obra mais nobre e consistente. Poderia ter sido Ivan, e no lugar da lamúria, haveria a lembrança de um inesquecível encontro.

Transcrevo abaixo dois poemas de Ivan Junqueira.

...

FLOR AMARELA

Atrás daquela montanha 
tem uma flor amarela;
dentro da flor amarela
o menino que você era.
Porém, se atrás daquela
montanha não houver
a tal flor amarela,
o importante é acreditar
que atrás de outra montanha
tenha uma flor amarela
como o menino que você era
guardado dentro dela.

TALVEZ O VENTO SAIBA

Talvez o vento saiba dos meus passos,
das sendas que os meus pés já não abordam,
das ondas cujas cristas não transbordam
senão o sal que escorre dos meus braços.
As sereias que ouvi não mais acordam
à cálida pressão dos meus abraços,
e o que a infância teceu entre sargaços
as agulhas do tempo já não bordam.
Só vejo sobre a areia vagos traços
de tudo o que meus olhos mal recordam
e os dentes, por inúteis, não concordam
sequer em mastigar como bagaços.
Talvez se lembre o vento desses laços
que a dura mão de Deus fez em pedaços.


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