14 abril 2025

Alejo Carpentier


Ernest Cole


O segmento abaixo é uma transcrição traduzida do espanhol do denso ensaio de Roberto González Echeverría, Alejo Carpentier, sobre o autor cubano, publicado em Narrativa y critica de nuestra America, pela editorial Castalia, Madrid, em 1978. O volume traz um conjunto de textos sobre diversos escritores latino-americanos que naquele momento se destacavam com suas narrativas. Optei pelo texto sobre Carpentier, um escritor que entusiasma pela descrição do barroquismo presente em nosso continente (e nesse sentido, muito bem abordado por Echeverría), ao trazer esse elemento expressivo da arte na composição do caráter do nosso povo, bem como o componente político arraigado nas múltiplas maneiras dele se realizar na realidade cotidiana. Como Echeverría bem observa, "Esse barroco é a nova metáfora carpentiana para o americano, que será a mistura, o sem estilo e sem método".

Além do que, Carpentier merecia, neste pequeno e insigne blog, uma lembrança ainda que discreta. Sem dúvida, o texto de Echeverría tem o mérito de abarcar com a devida profundidade o imenso narrador que foi Alejo Carpentier, mas não seria possível trazer neste espaço o ensaio em toda sua extensão, o que sem dúvida nos faz perder muito. Fiz a opção por traduzir a parte final, para ainda saborear a parte final deste importante estudo crítico. 

Fico particularmente orgulhoso em trazer um pouco que seja sobre a obra e o método de Carpentier; as falhas no ritmo ou na compreensão do texto ficam, por óbvio, sob minha exclusiva responsabilidade. Espero que apreciem.
 
(...)
"O recurso do método, que à maneira de Valle Inclán em Tirano Banderas e Asturias em O senhor presidente, destaca a figura de um ditador latino-americano, é esse futuro que a Revolução francesa anunciava. O título desta novela é, desde logo, uma paródia do de Descartes; mais do que uma paródia, é uma mescla de Vico com Descartes. Os recursos da história devem ser vistos, aqui, como as recurvas da mesma. O ditador hispano-americano regressa à França, de onde surgiu em princípio as bases de sua duvidosa legalidade, para dedicar-se desenfreadamente aos prazeres da carne, e ao labor de converter-se em uma espécie de déspota ilustrado, embora degradado; o ditador dorme em uma rede em seu suntuoso piso parisiense. Concerto barroco, o último romance de Carpentier, marca um retorno similar. Aqui vemos a influência da América na Europa. O barroco será assim o desarranjo do classicismo europeu como resultado do heterogêneo latino-americano: o Montezuma de Vivaldi, o esboço em gesso de tradições e traições, anuncia o jazz e outras manifestações exógenas do tipicamente novo do Novo Mundo. Esse barroco é a nova metáfora carpentiana para o americano, que será a mistura, o sem estilo e sem método. Nos últimos dois romances, surge um elemento novo em Carpentier, o humor.

García Márquez declarou que quando leu O século das luzes jogou no lixo o que tinha escrito de Cem anos de solidão e começou de novo. A influência de Carpentier sobre os novos novelistas tem sido enorme, às vezes, como no caso de García Márquez, por estímulo positivo, e outras, como em Severo Sarduy (quem parodia Intimidação, em Gestos), por estímulo negativo. Em prosa ficcional Borges e Carpentier são as figuras mais importantes na primeira metade do século XX na América espanhola. Borges por haver levado sempre até suas consequências mais radicais os problemas mais difíceis do ofício; Carpentier por ter moldado a uma temática latino americana experimentos novelísticos de alta envergadura, e sobre tudo, por ter feito da história latino americana seu tema principal. Além do que, por essa "curiosa indefinição" que o achacou Marinello em 1937 (no livro Uma novela cubana, publicado pela UNAM, México), Carpentier logrou dar causa à mais candente problemática hispano americana: a da falta de identidade, e conseguiu provar que, pelo menos em literatura, essa indefinição é o que define o americano. Ainda que, talvez, seja precisamente a indefinição o que defina a literatura, e então o exemplo de Carpentier será muito maior. 

Igualmente exemplar foi a entusiasta e laboriosa adesão de Carpentier à Revolução Cubana, que por fim lhe deu pátria desde a qual orientou suas multiplas peregrinações, e demonstrou a possibilidade de superar as contradições entre a vanguarda artística e a política.



Nenhum comentário: