09 março 2019

Formas de liberdade comprometida

O caminho para casa, Ladenburg, 2010


Há uma coisa que sempre me incomodou e que nunca soube definir com precisão. Vamos lá, uma nova tentativa, essa espécie de imposição em viver em círculos humanos restritos. Não consigo, me é penoso, seja o grupo de amigos da rua, a militância regular exigida pelo partido político, a confraternização gastronômica dos colegas de trabalho ou o núcleo de pesquisadores do centro de pesquisa. Do mais mundano ao mais sagrado, do mais despojado ao mais científico, sempre procurei evitar o vínculo de sangue.


O problema, a meu ver, são as demandas que não cessam, a hierarquização dos favorecimentos e os objetivos rígidos, assentados em pequenos rituais de consagração voltado ao círculo dos participantes. A bem dizer, a ordenação constituída revela o poder nas relações, a domesticação da ordem, nas palavras de Elias Canetti, "A criatura que se encontra numa situação de submissão acostuma-se a receber seu alimento de uma só mão. Tanto o escravo quanto o cão recebem seu alimento tão somente das mãos de seu senhor; ninguém mais tem a obrigação de lhes dar qualquer outro alimento". Se compreendermos a alegoria do senhor e do alimento chegamos ao que desejo expor, a hierarquização e o controle que um círculo fechado submete seus participantes. 

Sempre constatei a facilidade em entrar nesse tipo de grupamento fechado e a dificuldade em sair. A reverência quase mística quando se é aceito no grupo e a futrica de reputação quando se abandona os ritos impostos pela convenção. Os muros visíveis ou imaginários consolidam o garrote moral, que funciona de acordo com as conveniências do grupo. Ninguém escapa e o participante tem duas opções, fenecer praticando a moral do grupo ou renascer ao sabor das novas experiências.


Por que essa discussão? Porque penso que, a esta altura da vida, me sentirei bem em outras formas de liberdade comprometida, ou antes, desejoso para escolher colocar-me em ação, seja próximo das pessoas queridas, ao lado da pessoa amada, tomado pelos temas instigantes que atravessam de maneira incessante o caminho da reflexão e das pesquisas, convicto de poder contribuir com coisas interessantes e de não reproduzir situações de submissão e dependência.


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