Um amplo e pedagógico ensaio sobre o neoliberalismo, mostrando como ele se robustece ao ser incorporado em suas práticas econômicas e ideológicas pelo Estado. Destaco abaixo alguns trechos desta obra que chega em boa hora, recém-lançada pela Boitempo aqui no Brasil.
"A ação coletiva se tornou mais difícil, porque os indivíduos são submetidos a um regime de concorrência em todos os níveis. As formas de gestão na empresa, o desemprego e a precariedade, a dúvida e a avaliação, são poderosas alavancas de concorrência interindividual e definem novos modos de subjetivação. A polarização entre os que desistem e os que são bem-sucedidos mina a solidariedade e a cidadania. Abstenção eleitoral, dessindicalização, racismo, tudo parece conduzir à destruição das condições do coletivo e, por consequência, ao enfraquecimento da capacidade de agir contra o neoliberalismo". (prefácio)
"A historiografia descreve como os think tanks dos evangelistas do mercado permitiram lançar o assalto aos grandes partidos de direita, apoiando-se numa imprensa dependente dos meios empresariais, e como, pouco a pouco, as 'idéias modernas' do mercado e da globalização fizeram refluir e definhar os sistemas ideológicos contrários, a começar pela social-democracia". (p.205/206)
"O Estado não se retira, mas curva-se às novas condições que contribuiu para instaurar. A construção política das finanças globais é a melhor demonstração disso. É com os recursos do Estado, e com uma retórica em geral muito tradicional (o interesse nacional, a segurança do país, o bem do povo etc) que os governos, em nome de uma concorrência que eles mesmos desejaram e de uma finança global que eles mesmos construíram, conduzem políticas vantajosas para as empresas e desvantajosas para os assalariados de seus países". (p.282)
Vale muito a pena a leitura para acumularmos alguma espécie de resistência política em franco declínio, e de se compreender, de modo claro e direto, como o neoliberalismo remodela nossa existência ao instituir uma racionalidade voltada para a "generalização da concorrência como norma de conduta e da empresa como modelo de subjetivação". Na prática, uma interessante interpretação do brutal jogo político que, ao longo dos últimos meses na Argentina e aqui no Brasil, golpeia o estado de direito, elimina conquistas trabalhistas, desmobiliza as ações sociais.
A NOVA RAZÃO DO MUNDO, por Pierre Dardot e Christian Laval, ed. Boitempo, 2016.
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