Tornou-se um ritual,
nas minhas despedidas de Santo Amaro, meu pai me acompanhar até o ponto de
ônibus. Acertávamos, no breve percurso de cem metros, as sobras das
conversações tidas na mesa de refeição. Uma vez no ponto, aguardávamos o
coletivo que não tardava a chegar. A conversa da espera era diferente da
conversa da caminhada, como uma projetasse a avidez do mundo, em contraponto à terna
e delicada reflexão caseira. Uma, a ruptura da outra. A conversa da espera
ganhava consistência pelas expressões corporais. Meu pai silenciava aos poucos,
submetendo-se ao fluxo inoportuno de frases que eu elegia, e sua atenção se
fixava para a curva lá ao longe, onde o ônibus em algum momento despontaria.
Nos melhores dias, ficávamos dez minutos, uma desolada eternidade. Era mais
difícil nos dias de inverno, com o vento frio soprando inclemente, erguendo a
gola de seu casaco. Por fim despontava o ônibus, vindo dos baixios da João
Dias, uns trezentos metros até o nosso ponto. Atento ao fluxo de veículos, meu
pai sempre me perguntava, É esse que vem?, como se isso ajudasse a interromper
a passagem do tempo. Bastava lhe confirmar e um imperceptível gesto de decepção
assomava-lhe a face. Tinha tempo para o abraço e o beijo, para as últimas
palavras, atropeladas, que pouco ou nada revelavam. De dentro do veículo, ainda
conseguia observá-lo por uns breves segundos. E então a vida tomava outro rumo,
subitamente mais áspera e dolorosa. Aquele ponto de ônibus, naquele horário,
parecia servir unicamente ao nosso ritual de despedida. Como num sonho, era o
único a subir em um coletivo esvaziado, como se sua tarefa fosse me recolher e
me projetar para longe de quem me amava.
Por que não somos felizes nas despedidas?
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